Os inocentes da Copa
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Os inocentes da Copa



Em 2007, todos comemoramos a escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014. Os mais fanáticos pelo futebol comemoravam a oportunidade de ver a Copa pertinho de suas casas, a partir da promessa do governo de que os brasileiros teriam acesso a ingressos baratos.

Os mais antenados celebravam a oportunidade de se fazer obras e melhorias nas cidades-sede, imaginando que tais movimentos seriam um círculo virtuoso que poderia catapultar o Brasil a uma nação forte economicamente.

A Fifa imaginou que, com 7 anos pela frente para planejar, estruturar e executar as obras necessárias para o Mundial, o Brasil iria sediar uma Copa histórica e muito bem-feita. Achou que suas leis, inatingíveis até por regras vigentes no país, iriam suplantar o famoso jeitinho brasileiro de deixar tudo para o final, combinado com o jeito político de, além de fazer tudo na última hora, utilizar isso como desculpa para ganhar dinheiro.

A imprensa esportiva acreditou na possibilidade de que a Copa traria consigo as mudanças tão necessárias na estrutura do futebol brasileiro. Achou que, debaixo da lupa da Fifa e do mundo inteiro, seriam combatidas as mazelas históricas que acometem o esporte bretão. A violência seria erradicada dos novos, seguros e confortáveis estádios padrão Fifa, a desorganização e desmandos dirigenciais seria extirpada, e teríamos um futebol muito melhor.

Sabem(os) de nada, inocentes.

Nós, pobres torcedores, nos estapeamos em filas virtuais para garantir ingressos caríssimos, em lugares aleatórios escolhidos pela Fifa, nos submetendo a diversas regras que vieram a dificultar a clássica arte de torcer.

As obras, pelo menos as poucas que saíram do papel, estão em sua grande maioria inconclusas. Itens importantes, como metrôs, aeroportos e mobilidade urbana, ficaram só na promessa. Algumas obras não puderam ser salvas nem pelo hiper faturamento, tão tradicional e em voga no país da Copa. A 48 dias da competição, se discutem estruturas temporárias, se maquiam obras importantes para o trânsito dos torcedores, se encontram formas de não cumprir as exigências sabidas há 7 anos, num jogo de empurra onde ninguém assume responsabilidade pela bagunça e caos completo.

A Fifa está com um rojão nas mãos. O jeitinho brasileiro a derrotou, sem piedade, e a entidade já trata de aportar dinheiro para resolver pendências que há muito deveriam estar solucionadas. Sabe que agora não pode ameaçar tirar alguma sede da Copa, e nem levá-la para outro país. Não bastou ter afrouxado uma série de exigências e flexibilizado prazos para a conclusão de estádios; agora, vai ter que colocar mãos à obra e ajudar a finalizar o básico do básico, para que não tenhamos o pior Mundial de todos os tempos.

Fechando o time dos inocentes, as mudanças estruturais não vieram, pelo contrário: a sensação é que o futebol brasileiro, dentro e fora de campo, regrediu. A violência aumenta a cada dia, as novas Arenas têm sérios problemas de funcionamento, a insegurança jurídica aumentou a níveis alarmantes, e os times jogam cada vez pior. Nem na Libertadores, velho quintal brasileiro, não conseguimos mais nos destacar como antes.

Isso que nem estamos tratando de "los inocentes", "the innocents" ou "les innocents": os milhares de turistas estrangeiros que visitarão o Brasil acreditando que vão assistir à Copa num paraíso tropical, cheio de praias, sol e alegria. Imagina quem visitará Curitiba ou Porto Alegre no auge do inverno? Ou quem andar despreocupadamente pelas ruas de qualquer capital do país, aproveitando tranquilamente suas férias para conhecer o País do Futuro?

Pior é que, quando a bola rolar, todos nós inocentes estaremos hipnotizados nos estádios, na frente da tv e nas Fan Fests; mesmo aqueles que irão protestar nas ruas, aproveitando a repercussão que isso trará aos movimentos sociais, não se furtarão em acompanhar uma ou outra partida.

E estamos todos certos em participar dessa festa, ainda que sejamos inocentes: os errados, aqueles que arruinaram essa festa do futebol e da celebração de melhorias no nosso país, são os únicos que, desde o início, não tiveram um pingo de inocência e nem decência: os políticos brasileiros, campeões mundiais na arte de levar vantagem. Parabéns a todos eles, e minha solidariedade a todos nós, pobres inocentes, que não sabemos de nada...



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