Futebol
Sinforoso, um brasileiro
Não é de hoje que o apresentador/radialista Milton Neves faz campanha pela volta do "mata-mata" como fórmula de disputa do Campeonato Brasileiro (também conhecido como "Brasileirão", aquele campeonato que é o mais forte do mundo - sim, do mundo - pois sempre possui 13 ou 14 times que entram como favoritos, segundo boa parte de nossos solertes analistas). À parte o aparente retrocesso que tal ideia possa representar neste povo que tanto ansiou por ver seu torneio nacional enfim "organizado feito os europeus"; à parte algum (alguns?) interesse (interesses?) comercial que o jornalista possua que possa justificar sua pregação; mas um ponto não tão óbvio, e que de forma alguma esperaria que fosse levantado ou discutido pelos graúdos da imprensa esportiva, me pareceu importante salientar.
Não teria sido apenas isso, claro, outros fatores também influem pesadamente, mas os pontos corridos não teriam contribuído para que o jogador brasileiro se transformasse neste bonequinho de ventríloquo que aí vemos hoje, um burocrata com cartão de ponto em punho, um zero à esquerda que não possui mais qualquer poder de decisão? Um campeonato que rasteja da forma como esse Brasileirão de pontos corridos, talvez até pela inexperiência atávica do atleta nativo com esse tipo de fórmula "europeia", favorece a apatia - esta bem expressa por estes analistas leite-com-pêra de canal pago que cobram das equipes "a formação de bons elencos" e não mais "sangue nos olhos" por parte de quem está em campo (o tal "bom elenco" sempre diminui os riscos, para o bem ou para o mal, além de ser a desculpa perfeita para cozinhar os jogos em fogo brando, deixá-los ainda mais lentos por conta da prévia desculpa da "falta de conjunto", e ajudam a imbuir no profissional um excessivo senso de precaução que aniquila qualquer vitalidade que seu futebol possa apresentar). É como se, mesmo após definido o campeão, não houvesse qualquer emoção até para quem venha a comemorar esse título, pois isso se dá por um acúmulo que torna o imediato desimportante; não se encara cada jogo como um ato fundamental por si só, e sim como parte integrante de um todo que privilegia um "planejamento" metódico e indiferente. O "Brasileirão" lembra muito o personagem interpretado por Franco Nero no filme "Django" (o original), que anda pelo mundo arrastando um caixão preso a uma corda - mas a resolução que o pistoleiro apresenta para dar cabo de suas vítimas é inversamente proporcional à inércia do jogador moderno, esse adepto das "selfies" e das tatuagens porém com sérias dificuldades de acertar passes curtos. E, se a modalidade de disputa não é ela própria o peso morto a ser puxado até o fim do ano, o que esta provocou no futebolista pátrio, que de "irreverente" passou a "indolente" com grande facilidade (e com a constante proteção dos que deviam atacar esse estado de coisas - talvez aí a iniciativa de Neves em ser uma voz contrária mereça elogios), esse sim é um fardo desesperador a se carregar.
Pra se pensar.
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